segunda-feira, 5 de outubro de 2009

oficina de texto

Luz do sol dá dor de cabeça. O sentimento de acordar já foi mais prazeroso, eu costumava dar bom dia ao sol, faz tanto tempo. Minha luz é artificial, meu humor também, já não sou grata à natureza ou qualquer coisa que fuja do meu controle, por mais agradável que seja. O piano virou amigo, o cigarro, companheiro, a voz já vai rouca e a luz do sol me lembra quando acordei num dia feliz e percebi que talvez aquele fosse um dos últimos.

Não me lembro a última vez que a diverti com algum acorde novo, ela gostava tanto das minhas músicas, das minhas invenções, ela gostava de conversar comigo, me tinha muito apreço aquela menina. Eu esperei muito pela sua chegada, eu a quis, a exigi do meu lado, pedi a minha mãe que ela viesse logo, eu andava tão sozinha. Um dia ela veio, mal abriu os olhos e me viu ali perto, dando bom dia e boas vindas, sugerindo amizade. “É uma menina”... como eu, uma menina.

Ela continua uma menina ainda, parou no tempo. Nossa diferença de idade aumenta com o tempo, como isso é possível? eu só queria que ela crescesse, mas ela parou. Com 13 anos, passou a ter 13 anos pra sempre. Não estava mais presente em seus aniversários, nem no quarto ao lado. Eu permaneci ali.

Que terapia é essa? Ora, me encho de remédios pra evitar o que há de mais natural no homem, pensar. Me proíbo de tocar músicas que a faziam rir, evito seu quarto, suas coisas, evito fotos, lembranças então, são como minha sentença de morte. Fumo mais, fumo pra contrariá-la, se ela pode ir embora, eu posso fumar. Eu não deixei que ela partisse, ela foi sem minha opinião, ela não pensou em mim ao ir embora. Mal sabia que ela que me levava também, e da pior forma possível, ela me levou me deixando aqui.

Agora me vendo a todos os tipos de amor destrutivo, garrafas vazias, cinzeiros transbordando, sexo barato, pílulas pra dormir, pra acordar, pra não pensar, não quero, não vou. A paz dos perdidos, dos deixados, viúvos. Depois de você, desandei, perdi vontades, acharam que isso ia passar, perder irmãos é doloroso pra todo mundo, “ela está num lugar melhor”. Não me adianta!

Acordei com a luz do sol. Era feliz, ainda, a luz e tudo que me rodeava. Toquei qualquer coisa no piano - que nessa época ficava na sala, veio ao meu quarto uns anos mais tarde, quando não mais consegui dividi-lo com ninguém, não queria mais platéia - o telefone veio na última nota, minha mãe tentando parecer calma, uma situação armada para que eu não percebesse “antes da hora” que enfim, não me havia mais nada. Atropelado – o meu amor foi atropelado. Morto e pra sempre longe, perdi o que mais me enchia de vida. Foi assim.

Desde então foi vazio. Por algum motivo a presença de minha irmã surtia mais efeito morta do que viva, eu queria encontrá-la, cuidar da criança que eu vi nascer e que me tiraram assim, sem motivo. Fui em busca da minha antiga paz, corri pra encontrá-la e trazer de volta os acordes felizes. Uma pílula, duas, três, dez, vinte. E estamos juntas novamente.

2 comentários:

Thiago Moura disse...

olá mari!
quem a escreve é thiago... de belo horizonte...nos encontramos (conhecemos?) em julho.. fortaleza e canoa quebrada...

gostei dos seus textos... vou voltar aqui!

ah! ... e a vontade de conhecer a chapada, só aumenta...

ana laura disse...

muito bom, to encantada!