domingo, 9 de março de 2008

Por não estarem distraídos

Havia a levíssima embriaguez de andarem juntos, a alegria como quando se sente a garganta um pouco seca e se vê que por admiração se estava de boca entreaberta: eles respiravam de antemão o ar que estava à frente, e ter esta sede era a própria água deles. Andavam por ruas e ruas falando e rindo, falavam e riam para dar matéria peso à levíssima embriaguez que era a alegria da sede deles. Por causa de carros e pessoas, às vezes eles se tocavam, e ao toque - a sede é a graça, mas as águas são uma beleza de escuras - e ao toque brilhava o brilho da água deles, a boca ficando um pouco mais seca de admiração. Como eles admiravam estarem juntos!

Até que tudo se transformou em não. Tudo se transformou em não quando eles quiseram essa mesma alegria deles. Então a grande dança dos erros. O cerimonial das palavras desacertadas. Ele procurava e não via, ela não via que ele não via, ela que estava ali, no entanto. No entanto ele que estava ali. Tudo errou, e havia a grande poeira das ruas, e quanto mais erravam, mais com aspereza queriam, sem um sorriso. Tudo só porque tinham prestado atenção, só porque não estavam bastante distraídos. Só porque, de súbito exigentes e duros, quiseram ter o que já tinham. Tudo porque quiseram dar um nome, porque quiseram ser, eles que eram. Foram então aprender que, não se estando distraído, o telefone não toca, e é preciso sair de casa para que a carta chegue, e quando o telefone finalmente toca, o deserto da espera já cortou os fios.
Tudo, tudo por não estarem mais distraídos.

C.L

Depois disso eu passo a pensar que eu só entendo Clarice Lispector quando, em algum momento da minha vida, eu senti a mesma coisa que ela. Ela não necessariamente desembaralha o que fica no nosso cérebro, ela joga tudo no papel embaralhado mesmo. Eu gosto disso.

5 comentários:

Paula. disse...

li. bonito que só. e eu já vivi isso também...
berjo, marcy!

Anônimo disse...

e incrivelmente o que ela fala, cria a própria sonoridade do que eu pensaria estar ouvindo. Mesmo que o barulho de ocupado do telefone não seja propositalmente tudo tudo tudo pra ela.
enfim...

Anônimo disse...

se eu te falar que desde de sábado quando você citou esse texto ele não sai da minha cabeça você acredita?
estava até pensando hoje o quão difícil foi entendê-lo direito da primeira vez que o li...

...paixões platônicas eram mais simples.

Anônimo disse...

noss, tenso pra caralho esse texto hein? mas mto certo, aeuheauhuehaeu. infelizmente
mas q texto pessimista, mari, coloque coisas mais leves, tipo Juno
eauheaueahueaheauheuahae
eh nois

PS: oq CARALHOS esse "anonimo" quis dizer!??!?!

Lorena disse...

mari's blog bombando!
tem até anônimo postando!
já falei que não entendi o texto,né?
sou uma insensivel,ahiauiahah
=*